Pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) encontraram cepas da bactéria em fábricas de ração para suínos no Sul do Brasil capazes de produzir biofilme — o que as torna mais resistentes a processos de descontaminação. A ração de animais é um ambiente favorável para a transmissão da bactéria Salmonella em granjas suínas. O resultado foi divulgado neste mês, em um artigo publicado na revista científica “Ciência Rural”.
O Destaque Rural conversou com Doutora em medicina veterinária pela UFRGS, especialista em microbiologia e autora do estudo, Vanessa Laviniki, que abordou desde a formação do biofilme até estratégias de prevenção e controle dessa bactéria em ambientes de produção.
No trabalho, foram avaliadas 54 cepas de Salmonella enterica isoladas em quatro fábricas de ração animal localizadas no estado do Rio Grande do Sul.
Os pesquisadores simularam a sua capacidade de sobrevivência em temperaturas de 28ºC e 37ºC, num período de 24 a 96 horas. Todas apresentaram algum tipo de formação de biofilme, o que pode ser um fator de persistência em ambientes desfavoráveis, como fazendas, fábricas de ração, indústrias alimentícias e abatedouros.
A pesquisa identificou que a bactéria consegue formar biofilme em áreas de processamento de alimentos e em superfícies incluindo aço inoxidável, alumínio, plástico e vidro.
Proliferação de Salmonella e formação de biofilme
Segundo a autora do estudo, Salmonella encontra condições ideais para proliferação nas fábricas de ração devido à disponibilidade de matéria orgânica, temperaturas adequadas e controle específico de umidade. Os biofilmes são estruturas formadas por comunidades de uma ou mais espécies de células bacterianas que produzem substâncias capazes de protegê-las de ações químicas e físicas, ou seja, o biofilme atua como uma casa protetora para as células bacterianas, tornando-as mais resistentes a limpeza e sanitização.
“Isso as torna mais resistentes a condições de frio, calor, seca, falta de alimento e produtos de descontaminação ambiental”, afirma Vanessa Laviniki, doutora em medicina veterinária pela UFRGS e autora do estudo.
A especialista ressaltou ser mais difícil de fazer a higienização em fábricas de ração, pois não pode entrar com água no ambiente. “Nós estamos falando de matéria vegetal, com baixa umidade, com controle extremo de umidade, para evitar também a contaminação fúngica”, explica a doutora Vanessa.
Vanessa Laviniki, Doutora em medicina veterinária pela UFRGS, especialista em microbiologia e autora do estudo.
O desafio da resistência e controle microbiológico
Conforme a Doutora, a resistência de Salmonella está ligada às suas características genéticas, persistindo no ambiente mesmo diante de desafios constantes. “Ela é tão resistente devido às características genéticas que ela adquiriu ao longo da vida evolutiva, embora ela seja desafiada constantemente, ela ainda consegue se manter, consegue persistir por causa dessas características genéticas. Existem muitos estudos acerca da
Salmonella, justamente por ela ser um microrganismo muito importante para embargos comercias e também por causar um problema de saúde pública”, conta Laviniki.
Salmonella pode causar infecções alimentares graves em humanos. A resistência identificada neste estudo faz com que os microrganismos permaneçam nos ambientes por mais tempo, aumentando o risco de contaminação em toda a cadeia de produção de carne suína.
“O setor de frigoríficos e fábricas de ração contam com rígidos protocolos de higienização. Mas, quanto mais persistentes são as bactérias, maiores são os desafios das estratégias de descontaminação”, explica Laviniki.
Estratégias de prevenção e controle
A especialista enfatizou a necessidade de estratégias multidisciplinares, desde a limpeza física até a remoção química, para combater Salmonella. Ela destacou que a prevenção e o controle envolvem práticas ambientais rigorosas, seguindo legislações específicas e o uso de produtos comerciais especializados.
As fábricas de ração possuem uma dificuldade quanto ao controle, pois o ambiente não pode ser molhado para não prejudicar a produção do alimento, da ração em si, diferente dos frigoríficos que conseguem realizar uma limpeza mais física com água. “A gente tem um cronograma de controle microbiológico, colhemos amostras e fazemos análises. Além desse controle microbiológico, nós temos produtos comerciais não líquidos, usados para fazer esse controle, tanto de fungo, como de bactérias. Eles agem para a diminuição da carga microbiológica do ambiente” explica a doutora Laviniki.
Impacto na saúde pública e econômica
Salmonella, como uma zoonose, é transmitida aos humanos e animais por via de alimentos contaminados, e representa riscos à saúde pública e impactos econômicos negativos. “Temos muitas legislações a respeito desses controles, são legislações rigorosas. Então, enquanto a isso, a população não precisa se preocupar, porque o governo e os órgãos competentes são bem atuantes nesse sentido”, afirma a autora do estudo.
Destaque Rural