Safra 2024/2025

Estragos da enchente e chuvas atrasam semeadura do arroz na região Central do RS

Produtores tiveram que reestruturar as áreas atingidas pela enchente e sofreram com chuvas em setembro e outubro

Foto de máquinas em terreno.
Aproximadamente 90 mil hectares foram atingidos pela enchente na região | Foto: Jair Buske/Arquivo Pessoal

O Rio Grande do Sul, alcançou, nesta semana, 885,3 mil hectares de arroz semeados dos 948,3 mil hectares previstos pelo Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga) para a safra 2024/2025. Com isso, o Estado atingiu 93,36% da área total semeada. Das seis regionais arrozeiras, cinco já ultrapassaram os 90% e a Emater/RS-Ascar estima uma produtividade de 8,4 mil quilos por hectare para todo o Estado. Os trabalhos, no entanto, estão atrasados na Central, região mais atingida pela enchente de abril e maio deste ano.

Mas chama atenção que, na largada do plantio de arroz, em setembro, a Fronteira Oeste a Central foram as regiões que primeiro fizeram a semeadura do cereal no Estado, com 0,28% e 0,01% da área projetada, respectivamente. Até aquele momento, os orizicultores gaúchos tinham plantado 810 hectares. Na primeira parcial da safra 2024/2025 feita pelo Irga, a Campanha, Zona Sul, Planície Costeira Interna e Planície Costeira Externa ainda não tinham sequer iniciado o trabalho.

Na atual safra, a região Central registra 83,7 mil hectares plantados (66,48% dos 125,8 mil hectares projetados), conforme o último levantamento do Irga. “A região Central do Rio Grande do Sul ainda sente muito claramente os reflexos das enchentes e os produtores ainda estão recuperando áreas para conseguir fazer a semeadura”, reconhece o gerente da Extensão Rural (Dater) do Instituto, Luiz Fernando Siqueira. “O restante do Estado, no entanto, está fluindo e se encaminha para a fase final da semeadura”, acrescenta.

A previsão do tempo está ajudando as lavouras já semeadas, de acordo com Siqueira. “Essas chuvas que estão ocorrendo semanalmente estão ajudando muitos produtores no manejo inicial da lavoura. Isso também é bastante positivo”, observa. A chuva deve seguir ao longo dos próximos dias, com previsão de altos acumulados em todo o estado.

Região Central

O engenheiro agrônomo Enio Alves Coelho Filho, que coordena a regional da Depressão Central do Irga, está à frente de nove núcleos de assistência em municípios como Agudo, Cachoeira do Sul, Rio Pardo e Santa Maria. Ele lembra que a Central, por característica, é uma região que se faz uma semeadura mais atrasada em relação às demais cinco regionais do Irga.

Os produtores fazem o plantio dentro da janela preferencial – em que há o potencial das maiores produtividades – de outubro até o dia 15 de novembro. “Isso é histórico [a demora no plantio]. Esse atraso bem acentuado, neste ano, está muito ligado ao que passamos nas enchentes de maio, pois os produtores, nesse momento, ainda estão em reconstrução de suas áreas”, explica o profissional.

Coelho reforça que, além da necessidade de reestruturação das áreas, muitos produtores de arroz tiveram poucas oportunidades de trabalhar para reorganizá-las, devido às chuvas ocorridas nos meses de setembro e outubro. “As precipitações dificultaram muito a semeadura”, sublinha. Segundo o coordenador regional da autarquia, nos 32 municípios que formam a região Central do Irga, os estragos causados pelas enchentes foram significativos.

Um levantamento feito em visitas a propriedades da região Central mostrou que, em 317 delas foram perdidos silos, galpões, maquinários, bueiros, estradas, bombas, grãos e até mesmo o solo. A soma total da amostragem alcançou o valor de R$ 170 milhões nas áreas baixas dessa região, que tem o arroz como principal cultura.

“Em 1,5 mil hectares, os produtores encontraram verdadeiros cômoros de areia, com até 1 metro de altura. Outros 5 mil hectares estavam com áreas decapadas com materiais diversos, como árvores e sedimentos. A amostragem nessas propriedades da região apontou que aproximadamente 90 mil hectares foram atingidos”, contabiliza Coelho, que está há 13 meses na coordenação da regional da Depressão Central do Irga.

O agrônomo conta que os produtores estão reconstruindo as estruturas danificadas ou destruídas pela enchente. E destaca o resultado alcançado até aqui pelos orizicultores, que semearam 66,48% da área inicialmente projetada para a região. “O produtor rural gaúcho está mostrando muita determinação e resiliência, porque passou por um desastre climático e está aí trabalhando para recuperar a estrutura das lavouras”, ressalta.

Produtores trabalham para recuperar áreas atingidas pela enchente | Foto: Jair Buske/Arquivo Pessoal

Coelho evita fazer projeções sobre o término do plantio do arroz irrigado na região, mas alerta que não esperem uma supersafra na região mais castigada pelas chuvas extremas do primeiro semestre. “Ainda falta semear 41,5% da área projetada [até a última semana]. Não sei se os produtores conseguirão e agora ainda é impossível fazer previsões”, completa.

Pré-germinado

Nos últimos anos, o clima tem testado a perseverança do agricultor Jair Leandro Buske, de Agudo, pequeno município situado no Centro do Estado, a 245 quilômetros de Porto Alegre. Em 2023, fortes chuvas alagaram as lavouras de arroz do produtor, principalmente as partes mais baixas. Sem alternativa, ele teve que realizar o replantio em 5% a 10% dos 80 hectares destinados à cultura na propriedade, que fica na localidade de Picada do Rio.

Neste ano, as enchentes de abril e maio causaram grandes estragos. O agricultor havia semeado 80 hectares, mas viu as águas barrentas do Rio Jacuí avançarem sobre a lavoura. E, por pouco, a enchente não deixou submerso um trator. “Perdi cerca de 50% do que foi plantado. A enchente trouxe muitos sedimentos, muita areia e troncos de árvores”, lembra Buske, que estima um prejuízo de R$ 700 mil.

Por pouco, a enchente não deixou submerso um trator | Foto: Jair Buske/Arquivo Pessoal

Na propriedade de Buske e na dos vizinhos de Agudo, o alagamento da área está sendo tão comum – já houve três cheias do rio Jacuí – que os produtores optaram pelo sistema de plantio com a semente pré-germinada. A semeadura é feita por lançamento, parecido com a aplicação de fertilizantes, por exemplo.

“Às vezes não temos nem janela para entrar com máquina [para fazer o plantio]. Porque precisa que o solo fique menos úmido, que não chova por quatro ou cinco dias”, afirma o produtor rural, que é também diretor na Depressão Central da Federação das Associações de Arrozeiros (Federarroz).

O processo de pré-germinação consiste em submeter os grãos de arroz à água durante 24 a 30 horas, dependendo da temperatura, para que comecem a germinar. Depois, os grãos são deixados em repouso por 24 a 48 horas até brotarem. Para plantar arroz pré-germinado é necessário sistematizar a área, o que envolve a adoção de sistemas de nivelamento, drenagem, irrigação e viário.

O plantio na propriedade começou na última quarta-feira (20), bem distante da janela preferencial. Antes, porém, foi preciso recuperar as estruturas. O produtor reservou aos mesmos 80 hectares para o cereal e estima concluir a semeadura somente às vésperas do Natal. “O clima ajudou e fizemos a semeadura dos primeiros 14 hectares. A produtividade vai depender de como o clima se comportará em março e abril do ano que vem, mas a minha lavoura e a dos agricultores da região será afetada”, prevê Buske, que também cultiva soja, milho e trigo.