Os preços do trigo atingiram patamares históricos neste ano, incentivando uma expansão do cultivo da cultura. Porém, após atingir o preço médio recorde de R$ 2173,95 por tonelada em julho no Rio Grande do Sul, os preços registraram recuos e atualmente estão em R$ 1789,9, queda de cerca de 17,7%, de acordo com o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA-Esalq/USP). Apesar do valor seguir acima da média histórica, a situação alerta para a rentabilidade dos produtores, já que a tendência é de que os preços continuem caindo.
“A gente ainda deve ter nos próximos meses, podemos dizer que até o final do ano, com toda certeza, preços em queda no mercado brasileiro. O potencial, o limite para essa queda é difícil de determinar, mas se a gente olhar o mercado […], o viés claro das cotações para os próximos meses é de baixa, em função dessa safra gigante que está para começar a ganhar corpo no Brasil como um todo”, explica o analista Elcio Bento, da Safras & Mercado.
“A queda hoje é em função da iminência e início do ingresso de uma safra que deve ser a maior da história do Brasil”
Elcio Bento, analista da Safras & Mercado
Com preços internacionais firmes e o dólar em alta, a previsão de safra recorde é o fator que está impactando nas cotações. A estimativa da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) é de quase 9,4 milhões de toneladas de trigo, sendo que o estado de São Paulo já colheu um recorde de 400 mil toneladas. “A queda hoje é em função da iminência e início do ingresso de uma safra que deve ser a maior da história do Brasil”, destaca Bento.
Essa expectativa faz com que os compradores aguardem por preços ainda menores, enquanto os vendedores estão “reticentes”. “O spread entre compra e venda se abre e limita a realização de negócios, então há um mercado bastante lento em função desses fatores”, relata o analista.
O limite para a queda de preços vem do mercado internacional, a partir das exportações. “Em tese, os preços no Brasil podem cair até o momento em que os preços nacionais fiquem competitivos para compradores externos, quando chega a esse ponto, o moinho nacional precisa começar a comprar sob pena de ficar sem trigo”, explica. Porém, para isso, ainda é preciso que o preço recue ainda mais no mercado interno. Uma segunda alternativa, principalmente para o mercado gaúcho, é o preço do milho. Em caso de preços de trigo inferiores aos do milho, pode haver maior interesse de indústrias pelo cereal de inverno. “Se isso acontecer, as indústrias de ração animal passam a consumir trigo e a demanda de trigo para ração pode ser um suporte para impedir que os preços do trigo continuem caindo”, aponta o analista.
Rentabilidade
“Lamentável, [quando] plantamos estava 118 o saco e agora 90 e vai cair mais levando todo o lucro nosso”, comentou o produtor Ricardo Stöhlirck em uma publicação da Destaque Rural sobre previsão de safra recorde da Conab. Além dos preços atrativos, a lucratividade do ano passado também incentivou o cultivo, que alcançou mais de 3 milhões de hectares em todo o país. Com isso, o investimento também aumentou, o que custa ainda mais caro em um momento de insumos com preços elevados.
“O clima vem muito bem e o trigo colhido no Brasil deve ser de boa qualidade”
Elcio Bento, analista da Safras & Mercado
“Esse investimento forte do produtor na cultura deve trazer retorno, mas a margem de lucro neste ano deve ser mais curta, mais estreita do que foi no ano passado”, avalia Bento. Isso porque os preços do trigo continuam elevados, acima da média histórica, mas o custo de produção também cresceu exponencialmente. Para compensar, a busca deverá ser pela produtividade e qualidade. “O clima vem muito bem e o trigo colhido no Brasil deve ser de boa qualidade, isso pode dar um plus para o produtor”, indica o analista.
Internacional
A guerra na Ucrânia abalou o mercado internacional de trigo. Grande produtor do cereal, o Leste Europeu segue passando por instabilidade e incertezas quanto à produção. Ainda assim, Elcio Bento acredita que os preços internacionais atingiram um limite de baixa e agora se estabilizaram, apresentando uma tendência de recuperação.
A manutenção do corredor para exportação de trigo da Ucrânia é decisiva para a definição dos preços. Caso ele siga aberto, os preços não devem cair e a elevação deve seguir de forma branda. No entanto, “uma eventual suspensão das vendas na região pode fazer os preços subirem de forma mais intensa”, alerta o analista. Além disso, também há dúvidas quanto ao plantio da próxima safra de trigo ucraniana, considerando que o país pode não ter condições para isso.