“O principal erro na produção animal é não conhecer as características e o comportamento da espécie trabalhada”, afirma o coordenador de Bem-Estar Animal na MSD Saúde Animal, Filipe Dalla Costa. Segundo o especialista, ao entender as reações dos animais frente as nossas ações, é possível interagir de forma positiva, criando conexões homem-animal que facilitam o manejo, previnem acidentes de trabalho e melhoram a saúde e o bem-estar, impactando em produtividade e rentabilidade. Tratando-se especificamente de suínos, ainda é preciso entender que eles têm uma natureza gregária e de presa na natureza, por isso, a redução do estresse durante as práticas rotineiras de manejo diminui o estímulo a comportamentos de luta ou fuga, que podem ocasionar acidentes, lesões e, consequentemente, perdas produtivas.
“Precisamos lembrar que não é a força, mas, sim, o jeito que trabalhamos que determina o sucesso produtivo. São ajustes simples e de grande impacto. Por exemplo, a condução de lotes em grupos, evitando o isolamento de indivíduos, facilita a movimentação dos animais por se sentirem mais seguros”, diz Filipe. Animais estressados ou que enxergam o manejador como uma ameaça reduzem a expressão de sinais clínicos de doenças nas fases iniciais e subclínicas, dificultando a identificação precoce de enfermidades, o que gera maior uso de antibióticos na produção e comprometimento geral da saúde e bem-estar único, que considera a relação harmônica entre animais, pessoas e meio ambiente. É necessário entender que o sistema de luta-fuga do animal é ativado pela adrenalina e noroadrenalina, que preparam o corpo para combate, camuflando tosses, espirros, lesões etc.
Ajustando o sistema produtivo
No que tange as soluções e harmonia na produção, Filipe indica que se deve sempre trabalhar dentro dos cinco domínios do bem-estar animal (Alimentação, Saúde, Comportamento, Ambiência, Emoções positivas). “Eles interagem de forma dinâmica, e a falha em um dos domínios leva ao desequilíbrio para compensação em outro. Assim, evitar estresses agudos e crônicos reduz a chance de prejuízos orgânicos aos animais”, pontua o especialista. Ainda segundo ele, “precisamos estar cientes de que somos todos produtores de alimentos, independentemente da espécie trabalhada; quando utilizamos esse mindset, entendemos que cada ação impacta diretamente na qualidade do nosso produto final”.
Prejuízos que levem a desequilíbrios no bem-estar animal resultam em maior uso de antibiótico, mortalidade, disseminação de enfermidades, acidentes de trabalhos e, logo, menos sustentabilidade na produção de alimentos. “Aquele animal que morreu no embarque, por exemplo, consumiu recursos naturais e não foi transformado em alimento. Assim, quando consideramos a emissão por kg de alimento produzido, produções com menores níveis de bem-estar animal e maior percentual de hematomas, lesões e mortalidade de animais que não são transformados em alimentos são menos sustentáveis.”
Por isso, é fundamental ter atenção a pontos básicos, mas essenciais ao sistema produtivo e ao aumento da rentabilidade. A alimentação em quantidade e qualidade adequadas é o mínimo necessário, contudo, muitas unidades produtivas falham na redução de disputa entre indivíduos, principalmente no espaço no comedouro, na proporção de bebedouros por animal e na garantia da vazão mínima, ressalta Filipe. “Se você já tomou água em um bebedouro com vazão baixa, sabe do que estou falando. Provavelmente, você saiu com sede e frustrado, desistindo do recurso depois de um tempo. Ou se já recebeu um jato de água do bebedouro que saiu pelo nariz, vai entender”, exemplifica.
O uso de enriquecimento ambiental para promoção de comportamentos normais da espécie e redução de comportamentos agonísticos de mordedura de cauda e estereotipias vem sendo bastante discutido. No entanto, de acordo com o especialista, é preciso simular ao máximo o ambiente da granja ao natural da espécie. “Na maternidade, por exemplo, o comportamento da fêmea de preparar o ninho para o parto é algo inato e que promove emoções positivas, basta ter recursos disponíveis. Uso de materiais para exploração são essenciais, uma vez que na natureza o suíno pode passar 80% do tempo chafurdando. Ignorar ou não possibilitar a expressão desses comportamentos pode ser crucial para a manutenção de um bom nível de bem-estar animal e redução de efeitos sobre a saúde e produtividade.”
A ambiência reflete as características das instalações, onde podem ser trabalhadas questões de qualidade do ar, temperatura, umidade, ventilação, nível de gases, espaço disponível por animal e qualidade do piso. Filipe orienta que “a redução do espaço por animal (densidades mais altas) pode promover interações agonísticas entre indivíduos (brigas), disputa por recursos, lesões, redução na qualidade do ar e prejuízos econômicos graves”.
Portanto, “após um certo limite, menos é mais, ou seja, manter menos animais na instalação é ter uma produtividade maior, menos risco de perdas e maior qualidade da produção”, explica Filipe. Outro ponto de atenção é a qualidade do piso, pois pode afetar a movimentação dos suínos e levar a lesões que impeçam a movimentação, além de ocasionar dor crônica quando não tratada. “É essencial avaliar o ambiente para reduzir chances de perdas e promover melhorias para a saúde”, conclui.