por Rodrigo de Mundo e Miguel Narbot – Scot Consultoria
A escalada das tensões no Oriente Médio preocupa o agro brasileiro, especialmente no que diz respeito aos fertilizantes. A região é fornecedora de insumos para a agricultura brasileira e os conflitos têm o potencial de elevar custos e afetar a disponibilidade desses produtos.
Aumento dos preços da ureia
Nas últimas semanas, a cotação da ureia, por exemplo, subiu de US$5 a US$15 por tonelada no Brasil. Este incremento é reflexo da instabilidade no Oriente Médio, uma vez que a região é responsável por uma parcela significativa das exportações globais de ureia. Países como Omã e Catar representaram 30,0% das importações brasileiras de ureia em 2024.
A ureia é um fertilizante nitrogenado fundamental para culturas como o milho e o trigo. Qualquer interrupção do fornecimento ou aumento de preço impacta os agricultores, elevando os custos de produção e afetando a rentabilidade das lavouras. Atualmente, estima-se que são necessárias 68 sacas de milho para adquirir uma tonelada de ureia, evidenciando o peso desse insumo nos custos totais da produção agrícola.
A ureia, além de fertilizante para as lavouras, também é consumida na suplementação alimentar de ruminantes, especialmente durante períodos de seca, ao fornecer nitrogênio para a produção de proteína microbiana. Com isso, a ureia mitiga os efeitos da estiagem na produção animal.
Dependência do Brasil das importações
O Brasil depende da importação para suprir suas necessidades. No caso da ureia, o país não possui produção interna suficiente, o que o torna vulnerável a flutuações no mercado internacional. Em 2024, as principais origens da ureia importada pelo Brasil foram:
- Nigéria: 20,1% (884,97 mil toneladas);
- Omã: 19,0% (838,85 mil toneladas);
- Catar: 17,4% (767,38 mil toneladas);
- Rússia: 14,9% (656,72 mil toneladas);
- Venezuela: 8,1% (356,68 mil toneladas);
- Bolívia: 4,9% (217,58 mil toneladas).
Outros países, incluindo Argélia, Arábia Saudita, Egito e Barein, também contribuem para o abastecimento brasileiro.
Além disso, Israel desempenha um papel relevante no fornecimento de cloreto de potássio (KCl) ao Brasil, com uma participação de 6,5% das importações em 2024, correspondendo a 0,65 milhões de toneladas. O KCl é outro fertilizante importante, e a instabilidade na região pode afetar a disponibilidade e o preço
Impactos no agro brasileiro
A tensão no Oriente Médio eleva o risco de interrupções na oferta de fertilizantes, seja por problemas logísticos, como aumento do frete e bombardeios em portos ou plantas produtoras, ou ainda por restrições comerciais impostas pelos países envolvidos no conflito. Essa incerteza afeta os agricultores brasileiros, que podem enfrentar dificuldades na aquisição dos insumos para suas lavouras.
O aumento nos custos dos fertilizantes tem um efeito cascata na cadeia produtiva. Culturas como o milho, que dependem fortemente de fertilizantes nitrogenados e potássicos, podem sofrer redução na produtividade caso os agricultores optem por diminuir a aplicação de insumos devido aos preços elevados. Isso pode levar a uma diminuição na oferta desses grãos, afetando tanto o mercado interno quanto as exportações brasileiras.
Adicionalmente, a pressão nos custos de produção pode reduzir a rentabilidade dos produtores. A incerteza sobre os preços e a disponibilidade dos insumos dificulta o planejamento, o que pode resultar em um aumento nos preços finais dos alimentos.
Os efeitos na pecuária são semelhantes. O aumento no preço da ureia, ou sua escassez no mercado brasileiro, desencadeia uma série de consequências, como o aumento dos custos de produção, já que a ureia é um componente essencial na formulação de rações e suplementos para bovinos. Isso pressiona as margens de lucro dos pecuaristas, que podem ser forçados a reduzir o uso de ureia nas dietas, comprometendo o desempenho dos animais, principalmente aqueles suplementados em pasto, e, consequentemente, a oferta de carne.
Consequências para as exportações brasileiras
O conflito no Oriente Médio também mexe com as exportações brasileiras de produtos agropecuários. A região é um importante destino das carnes e grãos produzidos no Brasil. Entre outubro de 2022 e setembro de 2023, os Emirados Árabes Unidos foram o destino de 2,7% das exportações brasileiras de carne bovina in natura, totalizando US$257,27 milhões.
Com a escalada do conflito, há um risco de redução das importações desses países, seja por dificuldades logísticas, seja por instabilidade econômica. Além disso, rotas marítimas podem ser afetadas, aumentando os custos de frete e gerando atrasos nas entregas.
Cenário futuro e medidas necessárias
A tendência de alta nos preços dos fertilizantes deve se manter no curto prazo, especialmente se a tensão no Oriente Médio persistir ou se intensificar. As cooperativas e empresas do setor já sinalizam que os próximos lotes de ureia devem chegar ao Brasil com preços mais elevados, o que inevitavelmente será repassado aos consumidores finais.
Para mitigar os impactos, é preciso que o Brasil diversifique as fontes de importação de fertilizantes, reduzindo a dependência de regiões instáveis. Investimentos na produção nacional também são necessários para a autossuficiência do país e proteger o agronegócio de flutuações no mercado internacional.
Além disso, políticas governamentais que apoiem os produtores rurais, como linhas de crédito específicas para a aquisição de insumos ou incentivos fiscais, podem ajudar a amenizar os efeitos do aumento dos custos de produção.
Perspectivas de curto prazo: o futuro do agro brasileiro em meio ao conflito
O conflito no Oriente Médio representa um desafio para o mercado de fertilizantes brasileiro. A dependência de importações de regiões geopoliticamente instáveis expõe o agronegócio a riscos que vão além das questões comerciais, afetando a segurança alimentar e a economia nacional.
É essencial que os atores envolvidos – governo, empresas, cooperativas e produtores rurais – estejam atentos às movimentações internacionais e trabalhem em conjunto para encontrar soluções que garantam a continuidade da produção agrícola brasileira, preservando, de certa forma, a competitividade do setor e a estabilidade dos preços dos alimentos.
Fonte: Scot Consultoria