Lançamento

Antecipasto: consórcio de soja e capim proporciona maior tempo de pastejo e tolerância à seca

O sistema, desenvolvido pela Embrapa, é indicado para áreas de integração lavoura-pecuária

O melhor aproveitamento de áreas produtivas é um dos principais desafios atuais da agricultura e da pecuária. Nesse sentido, a integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) é um dos modelos de produção que vem avançando no país, especialmente a integração lavoura-pecuária. Para contribuir com a otimização dessas áreas, a Embrapa desenvolveu o Sistema Antecipasto, consórcio de soja e capim que está em fase de lançamento.

Nesse sistema, a semeadura do capim ocorre quando a soja ainda está em estádios iniciais no campo, o que permite que o capim se desenvolva mais rápido após a colheita da soja e que o pastejo do gado comece antes, aumentando o tempo total de pastejo nas áreas.

Durante décadas de pesquisa, ajustes e validação no campo, o sistema apresentou vantagens para o manejo do gado, ganho de peso dos animais e resiliência em anos de estiagem.

Tempo de pastejo

“Uma das principais vantagens é que tem uma certa garantia de que vai ter área para pastejo. Quando você faz a semeadura [do capim] após a soja, você já perdeu pelo menos uns 45 dias”, avalia o Diretor de Operação e Produção da Jarbas Barbosa Agricultura e Pecuária (JB APec), Carlos Eduardo Madureira Barbosa. A empresa participou do processo de desenvolvimento e validação do Antecipasto. Para isso, adotou o sistema há cinco anos em propriedades localizadas em Rio Brilhante-RS e Nova Alvorada do Sul-MS.

No modelo tradicional, quando a semeadura do capim é realizada após a colheita da soja, o pastejo começa aproximadamente 90 dias após a semeadura, considerando condições normais de chuva. No sistema Antecipasto, o capim é semeado e se estabelece durante o desenvolvimento da soja. Entretanto, a própria sombra da soja limita o crescimento desse capim. Dessa forma, ele apenas se desenvolve plenamente após a colheita da oleaginosa. De acordo com Barbosa, essa técnica permite o pastejo até 50 dias antes do sistema convencional.

Desenvolvimento

O desenvolvimento do Antecipasto levou décadas em que foram testadas diferentes cultivares e técnicas até que fossem encontradas as recomendações ideais. “A grande dificuldade é que o porte da soja e do capim são mais ou menos semelhantes, nós tivemos que lançar algumas estratégias para esse capim não competir com a soja, já que a soja é a cultura principal que o produtor utiliza na nossa região”, lembra o pesquisador Luís Zago Machado, da Embrapa Agropecuária Oeste, de Dourados-MS.

A primeira estratégia foi adotar o uso de cultivares de soja de porte alto, que têm maior capacidade de competição e de proporcionar sombra ao capim. Em seguida, foram testadas diversas cultivares de capim até que se chegou a um capim de porte mais baixo e que se estabelece de forma mais lenta, o que diminui a capacidade de competição com a soja. Em relação à população de sementes de soja e de capim, a orientação é seguir a mesma recomendação do cultivo solteiro.

Outro ponto que precisou ser ajustado ao longo do tempo é o momento de semeadura do capim. “A gente semeia a soja e quando está com o terceiro trifólio, por volta desse estágio, a gente entra semeando o capim na entrelinha da soja. Por isso a gente tem que aumentar o espaçamento da soja de 50 a 60 centímetros para poder entrar uma plantadeira na entrelinha da soja”, explica Zago Machado.

A soja produz normalmente e a gente colhe safra cheia da soja.

Luís Zago Machado – pesquisador da Embrapa Agropecuária Oeste
No momento da colheita da soja, o capim já está parcialmente estabelecido | Foto: Luís Zago Machado/Arquivo Pessoal

Os pesquisadores acreditam que, seguindo essas recomendações, não há compromentimento do rendimento da soja. Caso o capim cresça de forma mais expressiva, a recomendação é utilizar uma subdose de herbicida para retardar o crescimento do capim. “A soja produz normalmente e a gente colhe safra cheia da soja. E, em seguida, a gente tem o capim já parcialmente estabelecido na colheita da soja e, por volta de 30 dias após a colheita da soja, já pode entrar em pastejo”, ressalta o pesquisador.

No momento da colheita, o porte baixo do capim também permite que a operação ocorra normalmente. “A colheitadeira colhe na mesma velocidade, não tem problema, a umidade não aumenta e as impurezas também não aumentam, a soja se colhe normalmente”, garante Zago Machado. Em alguns casos, foi observado que o capim pode crescer mais nas bordas das lavouras, por isso não é recomendado plantar o capim nessas áreas até a colheita da soja.

Seca

Diversos municípios do Mato Grosso do Sul passaram por longos períodos sem chuvas nos últimos meses, principalmente no outono, o que prejudicou o estabelecimento de pastagens na sequência da soja. Essa situação atrasou o pastejo, o que afeta diretamente o rendimento do gado. Segundo o pesquisador da Embrapa, muitos produtores só puderam iniciar o pastejo em junho, enquanto áreas que adotaram o Antecipasto puderam ser pastejadas ainda em meados de abril.

A segurança de você ter as áreas para serem pastejadas faz uma grande diferença.

Carlos Eduardo Madureira Barbosa – Diretor de Operação e Produção da Jarbas Barbosa Agricultura e Pecuária

Essa diferença ficou clara para quem já adota o sistema. Nas propriedades da Jarbas Barbosa Agricultura e Pecuária, até poucas semanas atrás, as áreas de pastejo semeadas após a colheita da soja ainda não estavam prontas. Até esse momento, as únicas áreas da propriedade onde foi possível realizar o pastejo foram as áreas em que o Antecipasto foi adotado. “Neste ano ficou muito evidente um dos benefícios do sistema Antecipasto, o momento em que você tem as áreas para serem pastejadas em relação àquelas áreas em que você semeia em pós-soja. Então a segurança de você ter as áreas para serem pastejadas faz uma grande diferença”, destaca o Diretor de Operação e Produção.

Rendimento

Esse tempo maior de pastejo é decisivo para o ganho de peso dos animais. A forrageira mais recomendada no Antecipasto, a BRS Tamani, já proporciona um certo ganho de peso, porém o tempo de pastejo é considerado decisivo. “O ganho de peso é muito mais vinculado ao tempo dos animais expostos à área do que necessariamente a uma forrageira que você viria a implantar”, explica Barbosa.

O aumento do tempo de pastejo é uma das principais características do Antecipasto | Foto: Luís Zago Machado/Arquivo Pessoal

De acordo com Zago Machado, com a safrinha de pasto semeada após a soja, o rendimento é de 5 a 7 arrobas por hectare de carcaça produzidas. Esse número aumenta para entre 10 e 11 arrobas por hectare no Antecipasto. “A gente consegue colocar mais animais na área, pastejar mais cedo e o ganho que a gente obtém com esse consórcio é maior”, afirma.

Segurança

Apesar desses benefícios, a maior vantagem para quem está experimentando o Antecipasto é a maior garantia de ter pasto disponível durante o inverno. Além de aumentar o rendimento, essa possibilidade facilita o planejamento das propriedades e o manejo dos animais. “A gente depende de ter pasto no inverno porque as propriedades estão todas conectadas e temos propriedades que dependem desse pasto para fazer o desmame e recria dos animais”, aponta Barbosa.

Recomendação e potencial

O Antecipasto é recomendado para áreas localizadas em regiões tropicais. Regiões com ocorrência frequente de geadas, especialmente no Sul do Brasil, não são adequadas para o sistema pois a cultivar de capim mais recomendada é pouco tolerante à geada.

O sistema tem grande potencial de se desenvolver em áreas de expansão agrícola da soja. “Hoje a soja se expande para solos arenosos, onde tem restrição hídrica e se consegue uma única safra de soja. Então não é possível fazer uma segunda safra com milho. E o capim, como é menos exigente em água, ele consegue se estabelecer e produzir. Se a gente fizer o Antecipasto, nós conseguimos antecipar o pastejo e garantir o estabelecimento nessas áreas mais restritivas”, explica Zago Machado. Muitos desses solos arenosos já têm pecuária, o que facilitaria a adoção de soja no verão e pastagens no restante do ano. “O Antecipasto entra muito bem nessa integração lavoura-pecuária”, reforça.

Desde que começou a trabalhar com o Antecipasto, há cinco anos, em parceria com a Embrapa, a Jarbas Barbosa Agricultura e Pecuária vem expandindo as áreas com o Antecipasto, começando pelas áreas mais férteis e seguindo para locais com terras mistas e que ainda estão no início do processo de integração agricultura-pecuária. “Em ambas as situações estamos obtendo sucesso”, avalia Barbosa.

Os dados¹ mais recentes sobre ILPF estimam que o Brasil tinha 17,43 milhões de hectares com esse sistema na safra 2020/21, sendo a maioria, mais de 3,1 milhões no Mato Grosso do Sul. Do total de áreas de ILPF no país, a maior parte adota o sistema de integração lavoura-pecuária (ILP), chegando a 83%, conforme a Rede ILPF.

A tendência de crescimento das áreas com lavoura-pecuária (ILP) e os incentivos para adoção desse sistema no país mostram que há potencial para a implementação do Antecipasto. O sistema ainda dá seus primeiros passos, mas indica ter potencial para se expandir nos próximos anos.

¹ Polidoro et al. (2020)

O portal Destaque Rural viajou ao Mato Grosso do Sul a convite da Embrapa com todas as despesas pagas.