O uso de fungicidas multissítios, que atuam em vários processos metabólicos do fungo, e a combinação desses defensivos com um conjunto de estratégias reduzem a gravidade da ferrugem da soja.
Essa foi uma das conclusões de uma rede de pesquisa composta por 32 cientistas brasileiros, que avaliaram a eficácia de fungicidas (registrados e em fase de registro) no controle da ferrugem-asiática da soja durante a safra 2022/2023.
Os resultados desses estudos foram recentemente publicados na Circular Técnica 195: Eficiência de fungicidas para o controle da ferrugem-asiática da soja, Phakopsora pachyrhizi.
“Os resultados obtidos e compartilhados anualmente pela rede têm sido utilizados para auxiliar técnicos e produtores na determinação de programas de controle mais eficazes para a ferrugem-asiática, que é a doença mais severa da soja”, destaca Cláudia Godoy, pesquisadora da Embrapa Soja e uma das autoras da publicação.
A publicação, editada pela Embrapa, é o resultado de ensaios cooperativos realizados por 23 instituições de sete estados brasileiros (Bahia, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná, Rio Grande do Sul e São Paulo) e do Distrito Federal.
Godoy explica que os experimentos cooperativos vêm sendo realizados todos os anos desde a safra 2003/2004.
“Os resultados permitem acompanhar as mudanças na eficácia dos fungicidas ao longo dos anos, devido à adaptação do fungo. Com isso, fornecemos informações para que o produtor possa utilizar os fungicidas mais eficazes, sempre fazendo a rotação de diferentes produtos e adequando os programas de controle à época de semeadura”, detalha.
Tipos de fungicidas para a soja
A pesquisadora explica que a maioria dos fungicidas utilizados no controle da ferrugem pertence a três grupos distintos: os Inibidores de desmetilação (IDM, “triazóis”), os Inibidores da Quinona externa (IQe, “estrobilurinas”) e os Inibidores da Succinato Desidrogenase (ISDH, “carboxamidas”).
Esses grupos de fungicidas também são chamados de sítio-específicos, porque atuam em pontos específicos do fungo. Atualmente, o fungo causador da doença, o P. pachyrhizi, apresenta mutações que o tornam menos sensível a esses três grupos, ou seja, o microrganismo se tornou mais resistente a essas moléculas.
Uma das alternativas para mitigar o efeito da resistência é utilizar fungicidas multissítios, que interferem em mais de um processo metabólico do fungo, registrados para a cultura da soja a partir de 2013/2014.
Eles têm sido recomendados para aumentar a eficácia dos fungicidas sítio-específicos (que atuam em apenas um processo do fungo) e retardar o desenvolvimento da resistência do patógeno.
Importância do pacote de estratégias de manejo no controle da ferrugem-asiática
De acordo com Godoy, o fungo causador da doença é capaz de se adaptar às estratégias de controle, seja pela perda da sensibilidade aos fungicidas, seja pela quebra da resistência genética presente em algumas cultivares de soja.
“Para retardar o processo de seleção de resistência e aumentar a eficácia dos fungicidas, todas as estratégias de manejo devem ser adotadas, incluindo a adoção do vazio sanitário, a semeadura no início da época recomendada com cultivares precoces ou com genes de resistência, o uso de fungicidas preventivamente ou nos primeiros sintomas, sempre fazendo a rotação de fungicidas e incluindo os multissítios naqueles que não os têm em sua formulação”, recomenda a especialista.
O vazio sanitário é um período de pelo menos 90 dias sem plantas vivas de soja no campo. Essa estratégia reduz o inóculo do fungo, que precisa de plantas vivas para sobreviver e se multiplicar. Isso também reduz a presença do fungo no campo e, quando combinado com a semeadura no início da época, constitui uma estratégia de “escape” da doença.
Além do vazio sanitário, são recomendadas no Brasil a utilização de cultivares com genes de resistência e de ciclo precoce, a preferência pela semeadura no início da época e o cumprimento do calendário de semeadura estabelecido por regulamentações de cada estado.
A pesquisadora da Embrapa explica que a definição dessas janelas de semeadura contribui para reduzir o número de aplicações de fungicidas ao longo da safra.
“Isso ajuda a retardar a seleção de populações do fungo resistentes ou menos sensíveis aos fungicidas”, esclarece.
Monitoramento da lavoura
Os pesquisadores da rede recomendam que os produtores de soja monitorem a lavoura desde o início do desenvolvimento, a fim de determinar o melhor momento para o controle químico, evitando atrasos nas aplicações, uma vez que os fungicidas disponíveis no mercado têm eficácia curativa baixa.
Algumas regiões que utilizam cultivares precoces e fazem uma segunda safra com milho ou algodão, por exemplo, têm conseguido evitar a doença ou apresentar incidência tardia, o que facilita o controle.
“Nas regiões em que a semeadura é mais tardia, as cultivares com genes de resistência e o uso de fungicidas têm proporcionado um bom controle, desde que não ocorram atrasos nas aplicações e sejam utilizados fungicidas com maior eficácia, associados aos multissítios”, explica Godoy.
A pesquisadora também informa que, nas últimas safras, as mudanças na sensibilidade do fungo da ferrugem aos fungicidas do grupo dos triazóis afetam o controle da doença com os ingredientes ativos protioconazol e tebuconazol (ambos pertencentes ao mesmo grupo).
“A presença de novas mutações e a variação na eficácia de ingredientes ativos do mesmo grupo, como o protioconazol e o tebuconazol, destacam a necessidade de rotação de ingredientes ativos dentro do mesmo grupo nos programas de controle da ferrugem-asiática”, ressalta.
Fonte: Embrapa