Apontada como uma nova fronteira agrícola, estima-se que a metade sul do Rio Grande Sul possua mais de 1,5 milhão de hectares que ainda podem receber culturas como soja, milho e cereais de inverno. Atualmente, a principal cultura é o arroz irrigado, que ocupa 957 mil hectares, uma área que vem diminuindo nos últimos anos.
Além desses hectares, muitas áreas estão prontas para o arroz e não são utilizadas devido à necessidade de rotação. “Nessa área excedente que se descobriu que dá para plantar soja, que dá para plantar milho, em função principalmente do aumento de preço que aconteceu na última década e em função da necessidade de melhorar esses solos para a cultura do arroz”, explica o pesquisador da Embrapa Clima Temperado Giovani Theisen.
No entanto, um empecilho dificulta a expansão e diversificação de culturas nas terras baixas. O excesso de água, benéfico para o arroz, não é tolerado por culturas como soja e milho. Para contornar esse desafio, tecnologias vêm sendo desenvolvidas para permitir esses cultivos, entre elas o sulco-camalhão e o camalhão de base larga. “São duas técnicas muito eficientes em drenar o solo, em propiciar que se coloque uma soja, um milho, um cereal de inverno, protegendo as culturas contra o excesso de umidade”, resume Theisen.
Sulco-camalhão
“São canteiros que o maquinário faz, e em cima desses canteiros, que a gente chama de camalhão, são semeadas duas linhas de milho, soja ou feijão”, resume o pesquisador sobre a técnica sulco-camalhão. Além da drenagem, a tecnologia possui como grande diferencial a possibilidade de irrigação. Além disso, ela torna a terra mais apropriada para o desenvolvimento das raízes, permitindo um bom arranque inicial e rapidez de absorção de nutrientes. “É hoje talvez a técnica mais barata e com um custo benefício muito apropriado para irrigação de grandes áreas”, destaca Theisen.
As áreas que utilizam a técnica dentro da área da Embrapa vem apresentando resultados considerados positivos. Aliada ao uso de fertilizantes e de um pacote tecnológico, uma das áreas alcançou produtividade de 235 sacas por hectare de milho no ano passado. “Hoje em dia a gente consegue colher altíssimas produtividades nesse sistema, tanto milho, quanto soja. A gente vem ano após ano […] batendo recorde após recorde, mostrando que é possível utilizar essas áreas não só com arroz, mas com soja e milho, produzido bem e produzindo muito”, destaca.
Camalhão de base larga
Já o camalhão de base larga forma grandes estruturas, onde são feitos os cultivos. O método é antigo e seu diferencial é a perenidade. “Além do custo bastante baixo de implantação e da baixa exigência tecnológica, já que não depende de um equipamento avançado, ele é um sistema que fica perene. Se o produtor quiser, fica um sistema de longo prazo”, explica o especialista. O arroz não participa deste sistema, mas os camalhões podem ser desfeitos para receber a cultura.
Benefícios
A adoção de tecnologias como os camalhões para o cultivo de novas culturas é apontada como uma necessidade, já que a produtividade do arroz na metade sul alcançou um patamar difícil de ser superado. “É necessária a rotação de culturas, a integração lavoura-pecuária, a utilização dessas áreas no inverno com cereais, com gado, para que aconteça uma melhoria desses solos para favorecer os sistemas de produção onde o arroz participa”, ressalta o pesquisador.
Essa rotação e integração trazem uma série de benefícios, que vão além da agricultura. No entanto, o primeiro deles é justamente a melhoria da qualidade dos solos. Theisen aponta que cerca de 80% dos solos na região de Pelotas e Porto Alegre são pobres em matéria orgânica e fósforo. “Com a rotação de culturas, com essa integração, se consegue melhorar paulatinamente esses solos”, explica.
Economicamente, a expansão agrícola pode gerar um efeito social, com novas empresas e empregos, mas também para os produtores que terão novas fontes de renda. “A gente vê perspectivas muito boas para a metade sul. E, falando um pouco mais das terras baixas, nos próximos anos a evolução que vai acontecer certamente vai trazer benefícios para toda a sociedade e os produtores podem se apropriar desses ganhos”, avalia.
Cereais de inverno
Sensíveis ao encharcamento, os cereais de inverno não eram bem-vindos nas terras baixas da metade sul. As pesquisas e tecnologias, no entanto, vem mudando essa situação. “Se você dominar a drenagem é possível se fazer cultivo de trigo, triticale, canola, nabo forrageiro e várias outras espécies”, ressalta o pesquisador.
Além da melhoria da qualidade do solo, isso aumenta o giro econômico nas propriedades que passam a produzir também durante o inverno. Além disso, a falta de milho no mercado aumenta a procura por trigo. “Demanda tem bastante e oportunidade para utilização de cereais de inverno temos inúmeras, não são só nas terras baixas, como nas terras altas aqui da metade Sul”, aponta Theisen.
“Os produtores que estão experimentando […] estão muito contentes e com resultados promissores. De modo geral, a metade sul tem dois grandes cenários agrícolas, de terras baixas e terras altas, e para os dois cenários a gente vê muito boas perspectivas”, finaliza o pesquisador.